Listen on:
Alexia: Olá pessoal, bem vindo à mais um episódio do Carioca Connection. Hoje a gente vai conversar com a Christina Lorimer, ela é americana e que fala português fluentemente, então achei que seria uma ótima convidada pra bater um papo comigo sobre a vida dela, como é que ela começou com a essa vida de professora de inglês que ela faz hoje em dia. Enfim, espero que vocês gostem, eu não vou falar muito pra não dar muito spoiler. Então, let’s go with the episode.
Alexia: É, na verdade eu acho que aprender o espanhol pra você abriu as portas pro resto do mundo, literalmente. Porque depois disso você não parou de viajar, e aí teve a oportunidade de ir pro Brasil, e aprender uma terceira língua que tudo bem, é parecida com o espanhol? É, mas ao mesmo tempo é completamente diferente.
Christina: Então vamos pro** parte que é mais difícil né? Ele, o espanhol ajudou em termos linguísticos sobre, tipo assim, porque também quando você aprende outra língua que você deve saber muito bem, você começa a refletir sobre sua própria língua.
Alexia: É.
Christina: Então muita coisa que você às vezes aprendeu, mas provavelmente não sobre a sua primeira língua, sua língua nativa, aí de repente você precisa saber dessas informações para aplicar elas para esse novo idioma. Então essa parte eu já tinha feito entendeu? Aí espanhol também tem gênero, que é o** parte mais difícil para mim, sobre espanhol, sobre o português, mas pelo menos eu sabia que existia.
é a parte mais difícil…”
Alexia: Exatamente, é isso que eu falo sempre pros meus alunos. O espanhol vai te dar, pra quem aprendeu né antes, vai te dar uma base porque é muito parecido com o português nesse sentido, principalmente nos gêneros. A gente aprende a entender que tem gênero, pra quem é falante nativo de inglês, mas o resto...
Christina: É, mas e Alexia, essa coisa de gênero, ele** mexeu com a minha cabeça de um jeito que você não tem ideia. Foi uma coisa filosófica, eu entrei numa piração, tipo assim, “como uma cadeira é feminina?” Aí eu começava... Porque eu tava trabalhando muito com justiça social na época, eu começava a ficar puto** com qualquer coisa que era masculino. É tipo assim, “mas porque açaí é masculino? Tipo, coração, é, coração é muito feminina.” Tipo, porque tem que ser machista essa língua, né enfim.
Foi muito doido, mas entendi isso, entendi coisa de subjuntivo, entendi coisas de várias conjugações de verbos, então claro, o espanhol ajudou pra caramba e muitas das palavras são cognatos né? Não false friends, mas algumas das palavras realmente ajuda você a entender. Agora, o** parte que é muito difícil é o seguinte, por espanhol ser uma língua tão parecida com a língua portuguesa, confunde muito a gente, porque a nossa cabeça fica não entendendo realmente como trocar muito facilmente de um idioma para o outro, porque as palavras são muito parecidas. Ou seja você tem “entonces” e você tem “então,” então uma coisa que eu comecei a fazer, eu percebi, com meu espanhol, eu começava a pronunciar “entonces” mas com entonação e acento de “então.”
Então começava a falar “entonces.”
Alexia: É uma confusão, é uma confusão. Eu lembro que a minha mãe, a minha mãe era muito engraçado né, enfim, ela aprendeu, a primeira língua dela era francês.
Christina: Hmm.
Alexia: Então ela já desde pequenininha falava francês e português. Aí, começou a aprender inglês. O inglês era bem diferente do francês e do português, então tudo bem. Aí ela foi aprender espanhol e italiano, ela não conseguia falar nada.
Quando ela viajava pra Argentina, pra algum lugar assim, era tudo em italiano, com mistura de espanhol, com mistura de português, porque faz muita confusão mesmo no cérebro, principalmente...
Christina: Faz muito.
Alexia: Por exemplo, no seu caso, você fala português todos os dias, ok, você já consegue fazer diferença, mas no caso dela...
Christina: Mas eu não fala espanhol mais.
Alexia: No caso dela, quando ela ia visitar os países, aí que ela acessava a língua e aí que ela começava a falar, então era uma confusão.
Christina: Imagino. Imagino. Mas é essa coisa de práctica** é muito real né? Quando uma nova língua, com as nossas, nossos idiomas né? Com quem que a gente convive, mas tipo, faz muito tempo já, quase 5 anos, que eu não falo diariamente espanhol, que eu não falo às vezes nem um pouco espanhol, porque, que foi até uma coisa que me surpreendeu bastante, mas quando mudei para** Brasil, no começo eu tava com uma galera mais internacional.
Alexia: Uhun.
Christina: Porque eu, sabe, eu fiz parte de um grupo de pessoas internacionais lá na faculdade para poder ter amigos, ter amizades, aí tinha muito peruano. Então tinha uns** 4 ou 5 pessoas que tava** todo tipo, doutorado em matemática, foi muito interessante que é tipo assim, eu comecei a sair com 5 homens peruanos que eram matemáticos né? Eu falei “gente que que é minha vida aqui?”
Alexia: É o seu oposto, né? Totalmente ligada a arte, dança, humanas…
Christina: Totalmente, totalmente, mas foi muito engraçado, eu adorei eles e me acolheram e foi muito legal, mas aí eles se foram né? Entendeu, e eu também, eu começava a falar português eu tinha minhas** próprios amigos brasileiros. Então até no Brasil espanhol não tem uma presença muito forte, que não foi uma coisa que eu esperava, entendeu? Mas não, você não vai ouvir muito espanhol, você não vai, não tem tantas pessoas estudando espanhol, e tem poucos latinos de outros países.
Alexia: Sim.
Christina: Na América do Sul.
Alexia: Sim.
Christina: Então, eu tava esperando até poder utilizar e praticar o meu espanhol mais quando eu morava no Brasil e não foi o fato, aí meu espanhol se for perdendo. Aí eu voltei para** Estados Unidos e quando voltei dos Estados Unidos depois dessa experiência de Fulbright, eu tava dando aula de inglês na universidade pública em San Diego. Eu tava trabalhando com muito aluno internacional mas eu... Por mais que seja doido né, era San Diego, meia hora de** México, mas meu contexto, eu tava usando espanhol menos, não tava trabalhando em ONG né, não tava trabalhando com imigrantes, mas eu tava trabalhando com alunos universitários né, internacionais de** Arábia Saudita, da China… Que idioma eu to falando?
Alexia: China.
Christina: China. China e Japão e França, então eu não usava, não praticava meu espanhol, então foi assim, foi anos. Aí depois eu voltei pra Brasil de novo. Então, hoje em dia se você coloca tipo um cubano na minha frente e um brasileiro, eu não consigo ir de um para o outro, tenho que realmente tipo fechar meus olhos, concentrar muito para poder falar em espanhol hoje em dia, que é uma coisa que eu nunca na minha vida achei que ia acontecer.
Alexia: Mas isso aconteceu com o Foster também. Ano passado a gente foi pro Chile e ele, depois de muito tempo de não ter contato com a língua espanhola, porque ele teve praticamente a mesma experiência que você que espanha, né?
Christina: Sim.
Alexia: E aí quando ele foi pro Chile e o espanhol chileno é completamente diferente do espanhol da Espanha.
Christina: É muito rápido né? Você come muito as palavras né?
Alexia: É uma loucura, uma loucura. Ele ficou assim “eu não sei mais espanhol” e ficou muito depressivo em relação a isso.
Christina: É.
Alexia: Porque te dá um problema.
Christina: Porque é a nossa identidade, entendeu? Tipo assim, é uma das coisas que eu mais amo sobre aprender e ensinar línguas é toda o** parte mais comportamental e emocional e porque realmente tipo, eu sinto muita falta de espanhol, que é uma coisa que fazia muita parte da minha identidade por muito tempo. Eu tenho uma ligação muito forte com esse, essa língua. Então quando penso em espanhol, é como se fosse tipo assim, o meu melhor amigo da vida que eu já não tenho mais contato, tipo, às vezes amante, tipo assim…
Alexia: Que não tem Whatsapp, que não tem Instagram, que não tem nada...
Christina: A gente não tem comunicação mais. Eu sinto muita falta desse idioma, eu sinto muita falta porque aí tem a Christina, é uma coisa engraçada né, tem a Christina que fala inglês, tem a Christina...
Alexia: As personalidades.
Christina: Espanhola, a Christina que fala Espanhol e tem a Christina mais brasileira. E essa é outra Christina também, eu sinto muita falta dela também.
Alexia: Claro, claro. Óbvio, agora quando que você se tocou, por exemplo, você já tava no Brasil acho que pela segunda vez, né? Você já tinha um conhecimento maior da língua, quando que você se tocou que você conseguia se virar muito bem na língua? Que as pessoas podiam te compreender perfeitamente e que você falou “okay, estou falando português finalmente,” sabe? Não preciso de ninguém me ajudando ou me esforçar.”
Christina: É, isso definitivamente isso não aconteceu na primeira vez que eu fui, que era Salvador da Bahia para** 2 meses, isso quando eu fui pra Fulbright eu entrei também num ritmo que eu tinha que ser muito firme com as pessoas, porque eu tava fazendo pesquisa, assim, eu tava fazendo várias coisas na bolsa Fulbright né? Tava ajudando os professores do Departamento de Letras dentro da sala de aula, eu tava dando minha própria aula de extensão para alunos de pós (graduação) que era Inglês Para Fins Acadêmicos, eu tava dando palestras de cultura americana, eu tava fazendo treinamento de Toefl e eu tinha minha** próprio projeto de pesquisa que era o que eu realmente tava lá pra fazer.
Alexia: Uhun.
Christina: Que era Capacitação de Professores de Inglês na Rede Pública. Em quase todas essas situações eu tava falando inglês, então o que aconteceu? No começo eu tava ficando muito frustrada porque eu percebi que é uma coisa, tipo assim, a gente como americanos, quando a gente viaja a gente tem um monte de privilégio que a gente precisa reconhecer.
Alexia: Uhun, sim.
Christina: Mas tem uma coisa que é muito chato**, tem uma coisa que é muito chato** que faz parte da** pacote né, it’s part of the package, faz parte né, mas que é muito chato para nós porque todo mundo quer falar inglês. Então…
Alexia: Sim.
Christina: Onde você for, independente do país, independente de qualquer coisa, você vai chegar e você tem que entender as pessoas querem ser amigos comigo** porque gosta de mim, porque quer realmente ser amigo ou porque quer treinar o inglês?
Alexia: Mas é verdade.
Christina: Quer praticar o inglês comigo? Então eu tinha vários episódios, várias situações. Quando eu cheguei pra** Brasil essa segunda vez, quando eu fui lá para, no interior de São Paulo, onde as pessoas começava** querer sair comigo, me mostrar a cidade ou me convidar para lugares somente para praticar.
Alexia: Treinar o inglês.
Christina: Para treinar o inglês, que é uma coisa que é muito chata, não somente porque ué, né, que chato, mas também porque eu tava tentando aprender português. Então eu tinha uma situação particular que me impactou bastante que era uma colega minha que ela, a gente trabalhava dentro do mesmo escritório e todo dia eu combinei com ela, a gente tinha um combinado, chegou para** eu acho que o segundo mês que eu tava lá eu tinha que fazer um combinado com as pessoas e falar “é o seguinte, durante o dia a gente pode falar em inglês, mas o segundo que eu saio do campus, da faculdade, ninguém vai falar inglês mais comigo não, é só português tá gente? Tá? Todo mundo, combina? concorda?” Até com o meu host professor, e a família dela e as filhas dela, porque de repente eu também eu era professora de inglês das filhas dela só porque ela era meu… né? Eu falei não, então, mas com uma que era amiga na época, com uma colega a gente saiu e ela puxava, a gente saiu e ela continuava, a gente saiu, ela continuava, e tem uma situação, não sei se você já passou por isso, mas eu já passei várias vezes por essa situação que é muito desconfortável, que você tá falando com alguém em uma língua e a pessoa te responde em outra.
Alexia: Na outra, é. É.
Christina: Então, a gente foi, a gente foi pra** jantar e ela começava a falar comigo em inglês, e tentando ser mais sutil e não grosseira eu simplesmente respondia em português, para tentar fazê-la lembrar que a gente tinha esse combinado. E ela insistia, ela falava comigo em inglês, eu falava com ela em português, esse tug of war né, de línguas.
Alexia: É uma guerra fria, totalmente.
Christina: Nossa, e foi assim Alexia, até que eu, eu meio perdi minha paciência.
Alexia: Claro.
Christina: Eu falei “oh, é o seguinte, eu to aqui eu to tentando aprender português, porra, tipo assim, me ajuda aqui ué, eu to te ajudando o dia todo, to ajudando todos os alunos das faculdades da UNESP, to ajudando a comunidade, to ajudando os professores de inglês, to ensinando inglês para essa cidade de 500 mil pessoas o dia todo, alguém pode falar português comigo. Eu não to nem tentando pedir tutorial, só quero que você converse comigo um pouquinho em português.” Sabe? E aí nossa a amizade acabou.
Alexia: Claro, mas é óbvio porque ela tinha um interesse, você tinha outro, não tinha como, ainda mais depois de você ter feito o combinado, né galera?
Christina: Mas tava abusando né? Tem pessoas que também abusam desse, dessa troca de experiência e troca de cultura...
Alexia: É, eu nunca passei por isso porque realmente, por exemplo, com os meus alunos, só em português, eles não tão ali pra ficar fazendo, treinar nada comigo nem eu com eles, é só português mesmo. O Foster, quando ele vai visitar o Rio ou o Brasil e encontra as pessoas, tem alguns amigos meus que ficam querendo falar em inglês com ele até pra ver “e aí, eu consigo me virar ou não?”
Christina: Sim .
Alexia: E aí às vezes ele se incomoda, mas maioria das vezes ele fala assim “aqui galera, vamos aqui voltar pro português, porque eu to muito ruim” e vamos embora sabe?
Christina: Não mas tem jeitos também, tipo não me importa nem um pouco e tudo tem a ver com ler a situação.
Alexia: Sim.
Christina: E ler o contexto, e que às vezes pessoas faltam muito de** sensibilidade e às vezes não é culpa deles nada, é que as pessoas não tem prática em conviver com pessoas que fala** vários idiomas ou que são de países diferentes. Você deve entender isso muito bem, porque aqui nos Estados Unidos isso acontece muito né?
Alexia: Muito.
Christina: Em várias cidades sim, mas na maior parte do país a gente não, não é, a gente não é um país nem uma cultura que valoriza multiculturalism, nem multilingualism, então tem menos pessoas que viajam pra fora, que tem menos pessoas que tem experiência multiculturais, multilíngues. Aí você vai encontrar com pessoas que às vezes não é que a pessoa tá querendo ser rude, nem grosseira, nem impaciente...
Alexia: Não.
Christina: É que simplesmente essa pessoa não entende e não tem a prática de conversar ou de conviver com pessoas de outras partes do mundo.
Alexia: Sim.
Christina: Não é que tá ok, né, não to justificando esse comportamento de algumas pessoas daqui.
Alexia: Não, mas a gente entende melhor né.
Christina: Sim.
Alexia: A gente tem um pouco mais de paciência.
Christina: É.
Alexia: Né, nesse caso, então.