Transcript
Alexia: Oi, oi, pessoal! Bem-vindos a mais um episódio do Carioca Connection. E meu nome é Alexia, e estamos com um convidado especial no episódio de hoje, que é o meu pai, Marco Antônio.
Marco Antonio: Alô, Alexia, tudo bem?
Alexia: Que formal, pai!
Marco Antonio: Oi, Alexia, a filhota, tudo bem?
Alexia: Tudo, e você?
Marco Antonio: Maravilha! Abraço pra todos que estão escutando.
Alexia: Os seus fãs.
Marco Antonio: Sim, sim.
Alexia: Admiradores.
Marco Antonio: Exatamente. Bom...
Alexia: Pai, hoje, vinte e cinco de abril, é uma data muito importante por duas razões. Uma é o aniversário da Marina, uma das minhas grandes amigas.
Marco Antonio: Grande Marina! Beijos, Marina, ótimo, felicidade!
Alexia: Que você conhece desde que ela tinha quatro, cinco anos de idade, né?
Marco Antonio: Sim, era uma coisinha.
Alexia: E vinte e cinco de abril é uma data muito importante também aqui pra Portugal.
Marco Antonio: Sim, Portugal está parado num feriado, comemorando o vinte e cinco de abril, que é o seguinte: depois de muitas décadas de ditadura do Salazar, houve uma revolta militar, foi uma revolução sem sangue, graças a Deus, mas mudou completamente o destino de Portugal.
Alexia: Então, vamos aos pouquinhos.
Marco Antonio: Ok.
Alexia: Tá? Sem, sem como é que se diz? Sem ser muito intenso em relação a isso tudo, quem...
Marco Antonio: Foi uma espécie de pacificador no começo, ele instaurou uma ditadura. Essa ditadura deixou Portugal, vamos dizer assim, imobilizado, quase que completamente, politicamente, economicamente...
Alexia: Quantos anos de ditadura você sabe que foram?
Marco Antonio: Pouco menos que quarenta, porque ele morreu, e então o regime começou a se deteriorar. Na época, Portugal fazia uma guerra colonial em Angola, Moçambique, e havia uma grande insatisfação por parte dos militares com esse estado de coisas.
Alexia: Bom, e também, até pouco tempo atrás, para homens era obrigatório se inscrever no militar, né? Para ser militar, até a década de noventa, se eu não me engano. Para mulheres, eu acho que foi pouco menos, mas era obrigatório.
Marco Antonio: Exatamente. Todo mundo ia para a África lutar uma guerra sem sentido, enfim. A insatisfação foi crescendo. E, em vinte e quatro, vinte e cinco de abril, houve uma revolta militar. Como eu disse, sem sangue, foi uma revolução tranquila nesse aspecto, e mudou Portugal para sempre. A partir daí, Portugal teve, então, uma democracia.
Alexia: E o que que é chamado de Estado Novo?
Marco Antonio: O Estado Novo foi a ditadura do Salazar.
Alexia: Então, foi o fim do Estado Novo para o início de uma república.
Marco Antonio: Exatamente, de uma república democrática. Isso que é importante. Houve um período de grande confusão, uns dez anos mais ou menos. Depois, as coisas foram se acalmando, e, finalmente, a partir dos anos oitenta, Portugal vive uma tranquilidade democrática absoluta.
Alexia: Ainda bem.
Marco Antonio: Ainda bem, graças a Deus.
Alexia: Estão tentando mudar isso, um pouco, mas ainda bem.
Marco Antonio: Sempre existe o jogo do poder, minha filha, sempre. Pra sempre, mesmo no lugar mais perfeito, vai ter alguém gritando contra, mas isso faz parte da democracia.
Alexia: Agora, eu estava lendo um pouco sobre os dias, né, porque o regime, ou esse movimento do dia vinte e cinco de abril, na verdade, começou no dia vinte e quatro, né? Então, foi dia vinte e quatro, dia vinte e cinco, e no dia vinte e seis. Foram três dias que aconteceram... Então, por exemplo, os regimes, né, a infantaria, a parte dos militares, sei lá, o quê de cavalos, né, todos eles se juntavam para entrarem dentro, por exemplo, da televisão mais importante de Portugal, para conseguirem conquistar, entre aspas, a emissora, para conseguirem falar com o povo dessa forma, né? E com a rádio, e com a televisão, e com as prisões. Então, foi tudo, do norte a sul, que aconteceu isso, né?
Marco Antonio: Sim, houve muita tensão militar, mas as forças militares enviadas para combater a revolução, elas se juntaram à revolução.
Alexia: Se negaram, né? O os, como é que se diz, os sargentos, sei lá, os...
Marco Antonio: Os capitães.
Alexia: Os capitães deram ordens, né, de atirar contra quem estava, e eles se negavam.
Marco Antonio: É. Teve uma coisa em Lisboa bastante dramática, que foi uma companhia de blindados que recebeu ordem direta para atirar contra os companheiros, e se recusaram. E, além de recusarem, aderiram ao movimento. Então, a revolução, em dois dias, estava sacramentada, e Portugal havia mudado. Então, de quase quarenta anos de ditadura, passou a ter uma democracia em quase três dias.
Alexia: Claro que as coisas não mudaram de dia pro outro, porque é impossível você mudar qualquer país de dia pro outro, porque, enfim.
Marco Antonio: Claro, eu estou falando assim muito por cima, né? Teve muita tensão, teve quartel que se rebelou, forças do norte de Portugal, do Porto, foram para Lisboa. Os políticos agiram muito, é uma disputa de poder, realmente. Isso demorou, eu acredito que uns cinco anos, e, enfim, foi esfriando esse ânimo guerreiro, e, finalmente, lá pelos anos oitenta, Portugal teve assim eleições e tranquilidade democrática.
Alexia: Porque foi há cinquenta anos atrás, nós estamos fazendo aniversário de cinquenta anos de democracia. Por causa de quem lutou no vinte e cinco de abril. Agora, uma pergunta muito importante: por que os cravos? Explica a história dos cravos nesse dia. Revolução dos Cravos.
Marco Antonio: É um símbolo.
Alexia: Então, o que eu sei é que eles usaram as flores, os cravos, para mostrarem que eles estavam em paz, ou seja, ao invés de usarem as armas, eles usavam cravos, os militares, para mostrar que eles não iam lutar, que eles não iam atirar com nada. Então, todos eles carregavam cravos por causa disso.
Marco Antonio: Tem muitas versões desse cravo, mas, na realidade, é o seguinte: o cravo, a revolução de vinte e cinco de abril, chama-se Revolução dos Cravos, cravos vermelhos que a população inteira usava, os militares também usavam, e foi uma grande festa.
Alexia: É. É. Agora, é muito engraçado, pelo menos, eu, como brasileira, que também escutei muito sobre a ditadura brasileira, tenho na minha cabeça que os militares foram lá salvar o país, enquanto, no Brasil, os militares foram os que fizeram a ditadura, né, e que teve toda essa parte por trás.
Marco Antonio: Sim, aqui em Portugal, foi muito tranquilo. Os militares que tinham a condição de fazer alguma coisa, o resto do povo não tinha. Tinha a Polícia Secreta, que era a PIDE, todo jornal, toda televisão, tudo era censurado.
Alexia: DGS e PIDE, né? PIDE. E DGS também.
Marco Antonio: Eu não me lembro disso, tá? DG, mas o PIDE foi, era era muito brutal, e era proibido tudo, era muito controlado.
Alexia: Então, as mulheres eram consideradas propriedades dos homens, digamos assim. Não podia votar, se fosse professora, ou alguma outra coisa, como profissão, não podiam se casar, tinham que pedir autorização ao governo, à época, para poderem se casar.
Marco Antonio: É, eu sei uma coisa: o pessoal que saiu daqui de Portugal pro Brasil, geralmente, era homem que ia na frente, e depois levava a família. E, então, a mulher não podia imigrar sem autorização do marido.
Alexia: Não podia fazer nada sem autorização do marido.
Marco Antonio: Exatamente, é isso. E eu, e tem uma coisa que você tinha que ter autorização pra comprar isqueiro, tinha o seu nome, a sua fotografia, isso daí, pode ter...
Alexia: Ia estar de bicicleta também, sabia, ter bicicleta, também, sem...
Marco Antonio: ...ter. A gente pensa que isso daí é manobra, mas não é. É o seguinte: é é a mão do governo forte da ditadura entrando em todos os aspectos da vida social de Portugal, pra tudo era ter, você tinha que ter a mão do governo permitindo ou não, geralmente não.
Alexia: Eu fico imaginando esse processo todo, quando o novo governo democrático se instaurou. A maior parte da população, né, as mulheres em si, principalmente, eram analfabetos, né? Porque não podiam ir pra escola.
Marco Antonio: A taxa de analfabetismo era mais ou menos de setenta, oitenta por cento.
Alexia: O analfabetismo, exatamente. E, foram, isso aconteceu só há cinquenta anos atrás.
Marco Antonio: Sim.
Alexia: Tem muita gente que a gente vê na rua, nossos vizinhos, por exemplo, que viveram, né, e ainda tem muita gente na rua que fala que o que aconteceu é mentira, que, na época de Salazar, não era nada assim, que era tudo bom, que tinha que voltar essa época, que também são nostálgicos em relação a isso.
Marco Antonio: Uma tendência é que o passado é sempre romantizado, não é? Então, a pessoa que era jovem, tinha, naquela época, dez anos, quinze anos, e já, naquele tempo, era bom, enfim, isso acontece, não tem jeito. Mas, hoje, está todo mundo bastante tranquilo, a favor da democracia aqui em Portugal.
Alexia: Então, viva a liberdade! Sim! Viva o vinte e cinco de abril! Sim! Estou muito feliz em fazer parte desse país, que me abriu as portas desde sempre. Obrigada, Portugal, obrigada, Terrinha.
E é isso, pai, muito obrigada por ter estado aqui com a gente.
Marco Antonio: Ora, minha filha, fique à vontade, me chame sempre.
Alexia: E até a próxima, tchau!
Marco Antonio: Tchau!
Useful vocabulary
Oi, oi, pessoal! - Hi, hi, everyone!
Bem-vindos a mais um episódio - Welcome to another episode
Convidado especial - Special guest
Que formal, pai! - How formal, Dad!
Maravilha! - Wonderful!
Abraço pra todos que estão escutando - A hug to everyone listening
Grande Marina! - Great Marina!
Coisinha - Little thing
Depois de muitas décadas de ditadura - After many decades of dictatorship
Revolta militar - Military uprising
Revolução sem sangue - Bloodless revolution
Instaurou uma ditadura - Established a dictatorship
Imobilizado - Immobilized
Guerra colonial - Colonial war
Grande insatisfação - Great dissatisfaction
Obrigatório se inscrever no militar - Mandatory to enlist in the military
Revolução tranquila - Peaceful revolution
Estado Novo - New State
Período de grande confusão - Period of great confusion
Jogo do poder - Power struggle
Aderiram ao movimento - Joined the movement
A revolução, em dois dias, estava sacramentada - The revolution was sealed in two days
Quase quarenta anos de ditadura - Almost forty years of dictatorship
Disputa de poder - Power struggle
Esfriando esse ânimo guerreiro - Cooling down this warrior spirit
Tranquilidade democrática - Democratic tranquility
Aniversário de cinquenta anos de democracia - Fifty years of democracy anniversary
Revolução dos Cravos - Carnation Revolution
Usavam cravos para mostrar que estavam em paz - Used carnations to show they were at peace
Militares que tinham a condição de fazer alguma coisa - Military who had the ability to do something
Polícia Secreta - Secret Police
Toda televisão, tudo era censurado - All television, everything was censored
Proibido tudo - Everything was forbidden
Consideradas propriedades dos homens - Considered property of men
Taxa de analfabetismo - Illiteracy rate
Romantizado - Romanticized
Viva a liberdade! - Long live freedom!
Obrigada, Terrinha - Thank you, Little Land