Transcription
(notes & annotations forthcoming)
Alexia: Nuno, o Bezerra só tem coisas incríveis para falar de você.
Nuno: O que é isso? Não, o Bezerra, a gente é amigo há muitos anos, a gente perde as contas até. E ele toda semana veio falar, “E aí, você já gravou o podcast?” Falei, “Cara, rolou uma parada aí meio doida que…” Cara, acho que seu marido se vacinou, não foi isso? Teve reação e tal.
Alexia: Sim, uma loucura. Ele ficou mal, tipo, uma semana. Então assim, foi muito ruim pra ele, mas tudo bem, já passou.
Nuno: Coitado. Mas eu falei com ele hoje, falei mais cedo, falei, “Então, vai rolar o podcast.” Ele, “Po, que maravilha, não sei o que.” Ele falou, “Tô animado pra assistir.”
Alexia: E ele já deve estar acordado lá, né? Indo ver algum nascer do sol ou qualquer coisa parecida.
Nuno: Eu falei pra ele, “Você está no fuso horário da Europa, você acorda no horário que o pessoal da Europa tá acordando, é muito louco isso.”
Alexia: É. E Nuno, como é que você e o Bezerra se conheceram? Foi colégio, faculdade, o que que foi?
Nuno: Então, a gente entrou junto na faculdade de Design lá na ESPM, só que o Bruno, ele só fez um período e depois foi embora. Ele foi seguir fotografia. Ele falou, “Cara, não é nada disso que eu quero.” Mas foi o suficiente pra gente ficar amigo, cara, pro resto da vida assim. É muito maneiro isso.
Alexia: Eu fiz ESPM também.
Nuno: Ah, é? Do Rio.
Alexia: Do Rio. Sim.
Nuno: Po, que legal.
Alexia: Sim, sim. Só que eu fiz aquele curso que foi mais ou menos novo pra época, que é Administração com Ênfase em Marketing e Entretenimento.
Nuno: Cara, não sabia nem que tinha isso lá. Que legal!
Alexia: Então, pois é. Foi uma coisa nova, eu tinha entrado pro IBMEC, zero a minha cara o IBMEC, e aí eu descobri esse curso, que era mais ou menos o que juntava assim de bom pra mim. E aí eu fui, então eu fui de transferência para a ESPM e amei. Amei a ESPM, do começo ao fim. Assim, eu fiquei apaixonada.
Nuno: Ah, legal.
Alexia: É. E você se formou em Design então?
Nuno: Eu me formei em Design. Fui, inclusive, da primeira turma de Design da ESPM, é muito louco isso. Na época não tinha Design, a gente não teve veterano de Design, a gente levou trote da turma de comunicação. Os professores mudaram o curso ao longo do nosso curso, um monte de coisa. Então a gente foi meio que… A gente fala que a gente foi cobaia e pioneiro ao mesmo tempo.
pioneiro - pioneer
Alexia: E é um mixed feelings né? Disso tudo, porque assim… E também, é um super cobaia, porque o meu curso também foi o primeiro ano. Eu tinha entrado de transferência, mas a mesma coisa do que você, tipo, eu não tinha nenhum veterano, nada pra contar pra gente, sabe? O que que era, como é que era, etc. Então… Mas deu certo, deu super certo.
Nuno: Ah, que bom.
Alexia: É. Então vamos lá, me conta sobre você. Você nasceu no Rio, né?
Nuno: Sim.
Alexia: Pelo o seu sotaque, não nega, obviamente. E garoto do Rio, sempre foi e é isso?
Nuno: Cara, eu nasci no Rio tem 38 anos já. E era muito engraçado, porque eu só saí do Rio quando eu me formei na faculdade. Então, eu tinha um sotaque muito de Carioca no início da minha carreira, e eu ia pra São Paulo, eu fui pra São Paulo trabalhar, e aí o pessoal ficou “É o Carioca. Po, aqui não é essa moleza do Rio não, não sei o que. Aqui a galera trabalha, ninguém vai pra praia.” E aí, um ano depois, eu comecei a visitar o Rio de novo, todo mundo assim, “E esse sotaque de paulista, cara? Da onde tá surgindo?” Então eu perdi muito rápido o sotaque, mas ainda mantenho um pouco aqui.
mantenho - keep
Alexia: Não, você ainda tem sotaque de Carioca. Eu acho que o seu é o mesmo nível do que o meu, não é nem tão super, hiper, mega, mas tem ali o nosso S, o nosso R. Ainda tá aí, ainda existe.
Nuno: Sim. Eu falo que eu sou uma esponjinha, se eu fico conversando só com um Carioca em uma tarde, no final do dia eu tô falando igual funkeiro já. E se eu fico muito próximo de paulista, pessoal do sul ou de outras cidades, eu evito puxar o R do Carioca, sabe? É muito estranho isso, é quase que um volume do som que eu vou ajustando pra esquerda, pra direita.
funkeiro - someone who sings Brazilian Funk Music
Alexia: Comigo é mais o (sotaque) cantado, sabe? Então, por exemplo, se eu fico com a minha família de Minas, com os mineiros por muito tempo, eu começo a ficar cantando que nem eles, mas eu não perco o R, nem o S, eu só começo a ter entonação “a la mineiro”, sabe?
Nuno: Sim.
Alexia: E aqui em Portugal, tem algumas coisas também que eu já peguei, principalmente na escrita. Então tem isso.
Nuno: Bem legal.
Alexia: É. E aí, em Singapura, que você está aí, como é que você foi parar aí, na verdade? Como é que você chegou até aí?
Nuno: Cara, então… Eu me formei em Design, comecei a trabalhar, já tinha mais ou menos uns 3-4 anos de mercado. E aí eu entrei pra uma empresa que a filial dela é na África do Sul, né? O headquarters ficava na África do Sul. Eu já tinha visitado eles algumas vezes, passado um mês, dois meses de treinamento. E em algum momento, essa empresa decidiu abrir filial em Singapura para atender um cliente na época. E era muito engraçado, porque eu sempre quis morar fora, e na época eles tinham um escritório em Londres, era o meu sonho, “Eu quero morar em Londres, quero morar em Londres.”
Eu me formei em Design - I graduated in Design
Aí eles falaram um dia pra mim, falou, “Olha cara, a gente está abrindo escritório na África do Sul, a gente tem que mandar alguém lá e você já tá praticamente indo morar em outro país.” Eles estavam pra me mudar pra África do Sul. Eles falaram, “Porque você não vai para Singapura?” Daí eu, “Singapura? Como é que escreve?” Eu tive que ir no mapa, eu não sabia onde ficava. Eu abri o Google Maps na época para ver. Eu falei, “Caraca, é uma cidade da Malásia? É um país? Como assim? Que língua que fala lá?” E eu me mudei pra cá sem nunca ter vindo visitar, sabe? Foi muito louco isso.
Alexia: Eu tô imaginando você olhando no mapa e falando, “Meu Deus, pra onde que eu tô indo?” Sabe? “Como é que chega? Quanto tempo dura a viagem?”
Nuno: E o mais louco foi assim, hoje em dia você conhece muita gente que já visitou Singapura, né? Você consegue chegar nesse ponto já. Mas na época, foi em 2012 isso, a única referência de Singapura que eu tive, que eu descobri depois de falar com algumas pessoas foi, a minha irmã na época, hoje ela tá casada com ele, mas na época eles ainda namoravam, ela namorou o Bernardo que fez INSEAD aqui em Singapura, que é um curso de masters. Ele fez um módulo aqui, ele passou mais ou menos um mês ou dois aqui. Só que o Bernardo e eu, a gente não era super brother de trocar altas ideias, então eu só virei e falei, “Cara, tô sendo transferido para Singapura, o que que você acha? Você acha que eu vou curtir?” Aí ele só falou assim, “Cara, você ama tecnologia, você ama andar com câmera, laptop. Cara, já é teu lugar. Todo mundo lá anda com laptop no ônibus, no metrô, em qualquer lugar. É os Estados Unidos da Ásia.” Eles chamam ‘Ásia pra beginners.’ Aí eu, “Cara, é isso aí.” Me deu conforto, não tem erro, vamos embora.
Alexia: Que incrível. Então espera aí, antes de você morar em qualquer outro lugar fora, você foi direto pra Singapura mesmo, você nem passou na África do Sul, você foi direto pra aí?
Nuno: Então, morar morar mesmo, eu passei assim, dois meses na África do Sul, que a gente não chama nem de morar, porque eu não tinha visto pra morar, era um visto de turismo que eu ia pra fazer treinamento, atender reuniões que é possível. E aí, o primeiro visto de morar fora, foi vir pra Singapura. E até então eu ia ficar 6 meses, 8 meses assim até o final do ano. Cara, vim de mala e cuia, fiquei. Eles falaram, “Cara, quer renovar por mais um ano ou dois?” A gente foi renovando visto. Cara, na época eu tava namorando, a minha namorada veio, a gente ficou, a gente casou em Singapura, ela pegou o visto, veio morar comigo.
Eu vou acelerar, mas depois a gente para de volta. E dois anos, três anos depois morando aqui em Singapura, era importante que eu ficasse um período na África do Sul, porque a gente estava montando uma equipe lá, num projeto. E eu achei que era a melhor coisa. “Quer saber? Vamos embora, é outra experiência, vamos embora.” Aí fui com a minha mulher. Só que teve um problema, apesar de ser maravilhoso, a África do Sul, tipo, é lindo lá, tanto pra visitar quanto pra morar, a parte de visto é um pouco diferente, a minha mulher não podia trabalhar. Então o visto não permitia ela a trabalhar at all. Então o que ela fez foram coisas assim, a gente chama de trabalho informal. Nessa época ela estava começando a aprender fotografia, ela estava começando a estudar. Cara, ela colou em uma fotógrafa de casamento e tudo que ela hoje sabe, hoje ela é fotógrafa, exatamente, faz isso profissionalmente, ela aprendeu muito nessa época. Então foi bacana, foi legal.
E aí, depois de um tempo, eu acabei decidindo que eu queria voltar pra Singapura, da África do Sul. Falei com o meu chefe, falei, “Olha cara, então, dá pra eu voltar para Singapura? Você consegue me transferir de volta?” Daí ele, “Então, na verdade eu queria ver se você não quer ir pra Nova Iorque.” Daí eu, “Não, pera aí cara, não… Eu já combinei com o pessoal da equipe de Singapura, tá todo mundo okay.” Ele falou, “É então, mas...” Aí futuramente a gente descobriu o que tinha acontecido, eles iam fechar o escritório de Singapura e o escritório do Brasil, que foram os dois que eu tinha trabalhado e começado. Então eu falei, “Então ir pra Nova Iorque é quase que é isso ou é isso, né?” Aí ele falou, “É. Tem outros escritórios, o que você acha?” Aí eu falei, “Não cara, Nova Iorque, vamos embora agora! Onde é que eu assino?”
E fui pra lá, fiquei dois anos. Depois disso a gente começou a pensar se a gente queria voltar para Singapura ou não. Aí a gente saiu um pouco de Nova Iorque, deu dois anos e eu falei, “Cara, quer saber? Vamos ficar um tempo no Brasil.” Deu dois meses, meu ex-chefe que estava aqui em Singapura falou, “Cara, você não quer voltar pra cá não? A gente te ajuda a abrir a sua empresa. Eu sei que agora você está fazendo freelancer e tal. É bem mais fácil do que fazer isso em outro país.” Eu falei, “Cara, é mesmo? Será que eu consigo?” Ele, “Cara, vem.” E isso tem dois anos. Eu vim, e desde então nunca saí daqui mais, porque teve pandemia e a gente tá preso aqui tem quase três anos.
Alexia: É verdade.
Nuno: Então, total tem cinco anos de Singapura, dois de África do Sul, dois de Nova Iorque, dois e meio mais ou menos de Nova Iorque.
Alexia: E assim, Nuno, o que eu entendi é que Singapura é o lugar que realmente você realmente considera como casa, né? Assim, você vê aí como tem tudo a ver comigo, eu gosto, eu gosto das pessoas, da forma que as pessoas lidam com o dia a dia, porque… É engraçado, porque eu nunca conheci ninguém que tenha morado em Singapura. Eu conheço uma ou duas pessoas que passaram por Singapura voltando de algum lugar da Ásia, sabe? “Ah, vamos passar lá pra ver como é que é.” Mas assim, o que a gente escuta é, é um lugar incrível, mas tem muitas regras, é muito regrado. E aí eu não sei como é que você, brasileiro, que convenhamos…
Nuno: Carioca.
Alexia: É, Carioca, que a gente não está acostumado com tantas regras, principalmente governamentais, como é que foi essa adaptação pra você?
Nuno: Cara, você fez exatamente um comentário que todos os meus amigos fizeram na primeira vez que eu vim pra cá. Era assim, “Pera aí, eu consigo me ver indo para Singapura, eu não consigo te ver morando aí por mais de um mês, como é que você…” E aí começa um monte de coisa, várias leis e tudo, tolerância zero para qualquer coisa. Um exemplo bem bobo é, atravessar fora da faixa (de pedestres) aqui dá multa. Então cara, quem mora no Rio… O Rio nem tem quase sinal (de trânsito), é tipo, você torce pra… Você olha os dois lados, não está vindo carro, você atravessa.
Alexia: A gente atravessa na diagonal, a gente não atravessa na faixa, a gente atravessa na diagonal.
Nuno: Exato. E a gente veio pra cá, mas aí eu acho que cada lugar que você viaja, obviamente você absorve a cultura, mas eu acho que é como se fosse um videogame, ele dá um unlock em coisas de você que você não conhecia. E aí eu acho que comigo, o que aconteceu foi assim, não que eu goste de regras, mas quando eu tô num ambiente mais controlado, é quase um videogame.
Eu to jogando na fase, eu não consigo atravessar essa parede porque eu não tenho a chave, e é isso, eu não tenho, acabou. Eu não fico tentando atravessar aquela porta, porque eu não posso, porque eu não tenho a chave. Eu não estou no level... Então é quase que isso, eu tô aqui… Agora, por exemplo, as regras governamentais por conta da pandemia, é muito louco isso. Até agora… Mudou essa semana agora, mas até então, só podia sair em duas pessoas, que só pode sair em grupo de duas. E se você tem uma família, você tem dois filhos, você, seu marido, duas crianças, você vai num restaurante, você tem que sentar em mesas separadas.
Alexia: Meu Deus!