Transcription
Lucas: Pronto, zero, zero, valendo.
Alexia: Ótimo. Lucas, obrigada por estar aqui, de verdade.
Lucas: Imagina, maior prazer, cara. Maior prazer estar aqui contigo, trocar uma ideia e colaborar aí.
Alexia: Então me conta, Lucas, você está agora em Zurique.
Lucas: Exatamente. Estou em Zurique, na Suíça.
Alexia: Como é que você foi parar aí?
Lucas: Cara, essa história é esticada, mas vamos começar… Por onde podemos começar? Como que eu vim parar em Zurique? A resposta para como eu vim parar em Zurique, ela é bem direta. Até quando eu vou ficar em Zurique também é uma incógnita. Mas basicamente, eu estou em Zurique porque a minha noiva, ela é suiço-brasileira. A gente, na verdade, a gente se conheceu na Holanda, mas eu estava morando na Inglaterra na época, ela estava morando na Alemanha, a gente se conheceu na Holanda em função de uma viagem organizada por amigos em comum. E depois de várias voltas da vida, a gente resolveu ficar juntos, a gente começou o nosso relacionamento e hoje nós estamos noivos. Eu terminei o meu MBA na Espanha e, ao concluir o MBA na Espanha, eu vim pra cá. Então é isso.
Alexia: Exato, é uma vida super internacional. Então vamos começar do princípio, você é da onde do Brasil?
Lucas: Tá bom, beleza. O princípio… Eu nasci no Rio de Janeiro, eu nasci ali na Lagoa.
Alexia: Eu também.
Lucas: Acho que da nossa geração, todo mundo nasceu ali… Como é que chama aquela maternidade ali no Humaitá?
Alexia: Sorocaba.
Lucas: Não, não.
Alexia: Não?
Lucas: Ai, cara, já esqueci o nome daquela maternidade no Humaitá ali. Enfim…
Alexia: Eu não sei. Eu nasci na Sorocaba, que nem existe mais.
Lucas: Não, é uma rua ali. Se você quiser, eu vou até dar um Google aqui pra você incluir essa referência. Enfim, sou do Rio, meus pais moravam lá na Zona Sul, ali em Botafogo, quando eu nasci. No final das contas, meus pais queriam uma vida mais agreste, aí a gente se mudou pra Vargem Pequena, então a minha referência original do Rio de Janeiro é Vargem Pequena. Mas essa dinâmica toda internacional, ela começa de muito tempo.
A história é mais ou menos a seguinte, o meu avô, o pai da minha mãe, ele trabalhou durante um período para a ONU, sei lá quantos anos atrás, 40 anos atrás, 50 anos atrás. E foi nesse período que ele ficou trabalhando na ONU e morando em Nova Iorque que nasceu a minha mãe. Então a minha mãe, ela teve o direito a ter a cidadania americana, apesar de nunca ter tido. Então mais ou menos nesse período que a gente se mudou lá para Vargem Pequena, meu pai acabou tendo uma mudança profissional e teve a escolha de se mudar para São Paulo ou ficar no Rio.
Ele trabalhava na Gillette na época e foi dado a ele essa opção. E meu pai não gostava nada de São Paulo na época, então ele falou assim, “Não, se for pra São Paulo, eu não vou.” E enfim, tinham várias empresas na época que estavam migrando do Rio para São Paulo e ele optou não ir. Ai, em função disso, ele começou a ver as alternativas e sabia que tinha essa lenda que minha mãe tinha nascido nos Estados Unidos e etc. E aí ele começou a buscar a papelada… Lenda eu falo brincando, né?
Alexia: Sim.
Lucas: Essa história na família toda. Então meu pai acionou um advogado lá nos Estados Unidos, conseguiu arrumar a cópia do certificado de batismo da minha mãe de uma igreja lá em Nova Iorque. E em função disso ele conseguiu comprovar que minha mãe nasceu nos Estados Unidos, conseguiu a cidadania para minha mãe e, em função da cidadania, o green card pra ele, pra mim e pro meu irmão…
Alexia: Tudo porque ele não queria ir pra São Paulo.
Lucas: É lógico, pelo amor de Deus, né? Hoje em dia é até engraçado, hoje em dia meu pai até gosta de São Paulo, ele vai pra lá às vezes à trabalho ou algum outro motivo. Hoje em dia ele fala, “Hoje em dia eu até considero.” Mas, na época, ele tinha uma visão bastante radical. E aí, cara, começou assim, o meu pai startou um movimento. Na verdade, para ser justo, o meu avô startou um movimento que depois meu pai pegou debaixo do braço, que hoje em dia tem um impacto gigantesco na minha vida. Então a gente se mudou para os Estados Unidos eu tinha 7 para 8 anos de idade. O meu pai vendeu tudo que a gente tinha, ele foi na frente, ficou uns meses morando na casa de amigos até ele arrumar um emprego. Aí ele encontrou um emprego, aí depois veio minha mãe, eu e meu irmão. Aí a gente morou quase 8 anos nos Estados Unidos.
Alexia: Isso foi quando? Em qual ano mais ou menos? Você tem quantos anos, na verdade?
Lucas: Eu tenho 31 anos de idade.
Alexia: Igual a mim. Então ainda era na época que os Estados Unidos era okay um pouco com isso. Ainda dava.
Lucas: Era bem mais suave. E cara, isso foi pouco tempo depois do plano real. Então quando meu pai foi pra lá, o real estava quase de 1 para 1. Foi uma jogada… Enfim, meu pai é até economista, mas zero projeções macroeconômicas envolvidas, foi simplesmente “Vamos.” E no final das contas, acabou dando muito certo, né? Se não fosse por mais nada, ele quadruplicou o patrimônio dele em x anos. Se não fosse mais nada, né? Mas enfim, foi uma experiência muito boa em vários aspectos assim pra gente. Em termos de desenvolvimento profissional para o meu pai, em termos de exposição multicultural, aprendizado de outro idioma, né? Imagina, eu cheguei lá eu tinha 7 anos, o meu irmão tinha 5. A gente ficou nos Estados Unidos por 8 anos, a minha formação e do meu irmão em inglês é quase nativa, né?
Alexia: Eu diria nativa, né? Convenhamos. Porque vocês aprenderam, praticamente alfabetizados em inglês.
Lucas: O meu irmão foi alfabetizado em inglês. Quem alfabetizou meu irmão em português foi minha mãe em casa, a base de chibatadas e cadernos emprestados.
Alexia: Mas isso é incrível, aí vocês foram pra onde nos Estados Unidos?
Lucas: Ah cara, o critério do meu pai foi o seguinte, ele, “Cara, eu vou pra um outro país…” Porque voltando, isso aqui era 98, né? A internet ainda era assim uma coisa de nerd, né? Então… Enfim, muito limitado o acesso. Então, o critério foi muito mais, “Cara, onde que tem alguém por perto que eu posso pedir socorro se acontecer alguma coisa? Onde que eu tenho amigos?” Aí tinha alguns amigos ou pelo menos alguma coisa parecido com amigos na Califórnia e uma amiga da minha mãe que morava na Flórida, esse foi o critério número 1. O critério número 2 foi, “O que que eu consigo lidar melhor, furacão ou terremoto?” Aí meu pai falou, “Não, terra tremendo é demais. Eu estou acostumado com chuva, vamos com furacão.” Então a gente foi morar na Flórida. Moramos no sul da Flórida, curiosamente… Porque assim, o que o americano chama de cidade é o que a gente chama de bairro no Brasil, né?
Alexia: Sim.
Lucas: Mas era uma cidade chamada Plantation. A Flórida, ela tem muitos latinos de todas as espécies e qualidades. Mas cara, a gente conseguiu parar numa cidade que tinha tipo 0, assim, eram pouquíssimos. Brasileiro, teve alguns colégios que eu estudei que eu acho que eu e meu irmão éramos os únicos brasileiros.
Alexia: O que foi muito bom então, porque vocês realmente tiveram que aprender inglês.
Lucas: Sem dúvida. Mas até pela idade assim. Quando a gente chegou, num primeiro momento, a gente tinha alguns amigos brasileiros até que a gente conheceu, gente que morava por perto e tal. Mas cara, quando você vai tão novo assim pra um outro país, indo pro colégio e tudo, sei lá… O difícil é você manter o português, na verdade. O que você mais vê, é a galera passando o tempo, os pais ficam com receio de dificultar o aprendizado do inglês do filho e, na prática, perdem o português, não percebem que na verdade é o movimento no sentido contrário, né?
Alexia: Sim, mas que bom. Isso foi uma oportunidade incrível para vocês. Então acho que a formiguinha de morar fora e ter viagens internacionais e etc foi plantada em você ali.
Lucas: Foi, total. Cara, é uma quebra de paradigma, né? Todos nós, em todas as direções que você vai na direção do novo, o novo é meio paralisante. Seja um processo novo no trabalho que você nunca fez. Você recebe aquele e-mail, você meio que joga ele de lado, você meio que dá uma cozinhada. A tendência nossa é você criar uma espécie de uma crença limitante… Não, crença limitante não que isso é muito… Mas você cria um bloqueio ali pelo desconhecido, né? E isso foi totalmente retirado, né? Então esse conceito de ir para um outro país, se lançar e buscar uma vida nova, o meu pai, ele já colocou isso na gente. Já não era mais uma coisa desconhecida, então isso foi um aspecto muito maneiro, cara, porque a gente depois de quase 8 anos morando fora, foi no mesmo ano, dentro do espaço de um ano, morreu o meu avô… Desculpe, a minha avó, a mãe do meu pai e um irmão do meu pai, meu tio.. E aí, um fator que muita gente sente, né? Tem algumas pessoas que vão morar fora e cara, viram as costas total e essa é minha vida e ponto. Mas é muito comum você ver as pessoas depois de um tempo assim, uns anos, cara, o que vale mesmo da vida?
A qualidade da vida é muito boa, você tem acesso a muita coisa, mas vale você ser um eterno estrangeiro? Vale a tua família estar a quilômetros de distância e você não estar lá para dar aquele abraço quando as pessoas depois não estão mais lá.
Alexia: Sim.
Lucas: Isso de alguma forma bateu nos meus pais. O meu pai, depois de muito esforço, conseguiu encontrar uma oportunidade de trabalho no Rio, que ele também não queria voltar para outro lugar. Conseguiu encontrar uma oportunidade de trabalho no Rio que atendesse também, porque o meu pai não queria também jogar fora a qualidade de vida que a gente tinha. Então, de alguma forma, manter o tipo de vida que a gente levava e nós voltamos, né? Então nós voltamos para o Brasil para ter essa reinserção.
Alexia: Isso que eu ia perguntar, porque eu falei com uma outra amiga minha que também veio pra cá gravar comigo, e ela saiu também muito nova do Brasil, foi pros Estados Unidos, aí voltava para o Brasil, aí ia para os Estados Unidos e cada vez que ela voltava e ia, tinha que se reinserir naquele ambiente, né? Ela tinha que “aprender a ser brasileira de novo” e depois “aprender a ser americana de novo” e depois aprender isso e aprender aquilo. Então isso é muito confuso também na cabeça de adolescentes, de crianças e até de adultos, né?
Lucas: Cara, é doído demais. Eu lembro que eu sempre, quando as pessoas… É que ainda tem um outro pedaço da história, que a gente ainda vai chegar lá. Mas quando as pessoas me perguntam, “Ah, mas você é o que?” Eu sempre falo, “Cara, eu sou brasileiro com papéis.”
Alexia: Sim.
Lucas: Eu sou um brasileiro com papéis. Eu sou brasileiro, sempre fui, entendeu? Inserido lá na cultura americana, falando inglês perfeitamente, mas brasileiro, culturalmente me identifico e tal. Mas a real, cara, é que esse processo de reinserção cultural, ele é meio doído assim.
Alexia: Ele é doloroso. É doloroso.
Lucas: Cara, até mesmo assim, quando a gente voltou dos Estados Unidos para o Brasil, eu estava com 15 anos. Cara, pensa numa idade bosta pra você mudar de país, cara. É ali, adolescente, nossa. Porque aí vai desde assim, o mínimo de referência de traquejo do que pode ou não pode, de relacionamento. Porque isso muda muito dos Estados Unidos para o Brasil, né?
Alexia: Muito.
Lucas: Cara, vestimenta, os teus amigos. Nossa, eu apanhava e era muito engraçado, porque eu convivia principalmente com os meus pais em termos de português. Com quem eu mais falava português? Era meus pais e meu irmão. Então a minha forma de falar quando eu voltei dos Estados Unidos era muito velha.
Alexia: Sim.
Lucas: Eu lembro de uma vez que fazia pouco tempo que eu tinha voltado, eu falei no colégio, eu soltei um “pra burro” alguma coisa assim. “Eu não sei o que… pra burro.” Olharam assim pra mim e, “Porra, o que você tá falando, cara?” Sabe?
Alexia: Mas isso é muito verdade, porque o meu namorado, o Foster, quando ele aprendeu português, ele aprendeu sozinho, mas ele começou a me namorar então ele começou a pegar a minha forma de falar. E era uma forma, não feminina, mas era o meu jeito de falar como mulher fala. É que às vezes mulher fala palavrões diferente de homem, falam gírias diferente de homem e etc. E aí ele assim, “Eu preciso de amigo homem. Eu preciso de amigo homem para aprender a falar português de homem.” Sabe? Digamos assim. E é exatamente isso.
Lucas: Compreendo ele. Pois é, cara, então… E é desgastante, cara, principalmente se você está ali 15, 16, 17 anos…
Alexia: A gente é muito chato com 15 anos, a gente é muito chato.
Lucas: Pois. Então cara, eu totalmente me identifico com essa observação da tua amiga. Eu lembro que eu até escrevi uma vez um texto que eu falava disso, né? A gente nasce e a gente é criado dentro de um molde, né?
Alexia: Uhun.
Lucas: Aí você sai daquele molde, você já tem uma certa idade, por menor que seja, mas você já tem uma certa idade, quer dizer, já deu uma pequena enrijecida. Aí você sai daquele molde e vai pra outro lugar, aí você se insere naquele outro molde. Aí não cabe certinho, mas você faz uma força, porque você quer se sentir e tal. Aí você já pegou uma forma ali, aí filhão, já lascou pro teu lado, porque você já não cabe perfeitamente onde você estava originalmente, nem cabe perfeitamente onde você estava, então realmente é um trabalho interessante de autoconhecimento, porque você vê realmente onde é que estão seus valores próprios. Tem um processo de formação de caráter e amadurecimento nessa mudança de país que é muito boa, mas tem um ‘que’ de… ‘solidão’ é uma palavra muito forte, mas de fazer o seu próprio caminho, sabe?
Alexia: É solitário, porque só você sabe onde é que você estava inserido e onde você vai se inserir agora, porque eu acho que as pessoas não tem noção, às vezes, quando a gente fala, “Ah, eu vou viajar pra França.” Ah, tá bom, você vai viajar, mas você não vai morar lá. Quando você vai viajar internacionalmente, você tem um começo, meio e fim, né? Você sabe que você vai ficar lá uma ou duas semanas, você não precisa se inserir naquela cultura. Só pra fazer o básico, pedir um pão, comer no restaurante, visitar museu e voltar.
Mas quando você vai morar, é um processo emocional muito específico que você tem que passar. E eu acho que cada idade também muda. Quando você é criança é uma coisa, porque você não entende o que está acontecendo muito, você está ali e pronto. Quando adolescente, você quer fazer parte de uma comunidade, você quer fazer parte de um grupo. E adulto também, você quer fazer parte daquilo que você está, então é diferente, é muito diferente.
Lucas: Total, cara. Pra mim, foi muito interessante, porque dando uma sequência, né? Aí a gente voltou para o Brasil, teve esse processo, essa reinserção, tal tal tal, martela, martela… Descobre o vestibular, vence o vestibular, aquele rolê todo, porque cara, eu nunca tinha estudado português, eu estudei tipo 3 anos de português na minha vida e nego me colocou pra fazer uma prova pra competir… Enfim, naturalmente eu me formei em engenharia, né? E é engraçado isso, porque cara, eu gostava de escrever quando eu era mais novo, eu gostava de escrever, até concurso de poesia… Porque americano inventa concurso de tudo, né?
Alexia: Sim.
Lucas: Tem concurso de soletrar, concurso de escrita, de poesia, de falar em público, né? Então eu participava, eu ganhei prêmio de segundo lugar de maior número de livros lidos no ano, eu gostava dessa parte que hoje é considerada Humanas, né?
Alexia: Sim.
Lucas: De escrita e tal. Mas eu também gostava da parte técnica. Então não é que eu tive que abandonar uma coisa para seguir outra, mas mesmo se eu não tivesse já essa tendência, uma leve inclinação para a área de exatas, eu acho que eu teria que seguir por aí, porque a partir do momento que mudou de país, eu tinha que atravessar a barreira, né?
Alexia: Sim.
Lucas: Mas enfim, eu entrei, eu fiz a faculdade de engenharia na UFRJ e comecei a lutar para conseguir a bolsa para eu poder fazer um intercâmbio na França.
Alexia: Ah, eu falei sobre França e eu nem sabia. Eu não fazia ideia.
Lucas: Pois é. Então aí, cara, foi muito maneiro que eu consegui, isso foi antes do Ciências sem Fronteiras, então tinha muito menos bolsa, então eu consegui entrar, consegui uma bolsa que cobrisse um ano. Eu morei um ano em Marselha e foi tão interessante, cara, porque quando eu cheguei… Primeiro, francês não fala inglês, né?
Alexia: Não.
Lucas: Francês não fala inglês, a grosso modo, né? Se tiver algum francês me escutando… Se você está me escutando, é porque você não está incluído na classe francesa. Como, na verdade, eu não estou incluído na classe brasileira. Você pode falar muita coisa do braisleiro que não é exatamente assim o Lucas.
Alexia: Sim.
Lucas: E foi tão engraçado, cara, porque eu tinha uma espécie de memória afetiva no sentido de memória emocional, não de assim, uma memória emocional do processo de você se inserir numa outra cultura sem falar o idioma. E foi tão interessante, porque não era uma coisa lógica, mas eu me lembrava de já ter sentido isso. E isso me deu umas diretrizes, porque eu, quando eu cheguei lá na França, eu convidava qualquer nego que estivesse por perto.
Eu morava numa residência estudantil, eu via alguém fazendo mudança, eu falava pouquíssimo francês, mas eu já saía catando coisa pra ajudar o cara, não sei o que. “Não, vem jantar lá em casa, fazer um ovo mexido com arroz, com qualquer coisa.” Mas porque, pra mim, eu sabia o quanto era crucial para minha saúde emocional eu ter conexão com as pessoas, porque eu já tinha vivido aquele processo inteiro, de cabo a rabo.
Alexia: Sim.
Lucas: Então eu sabia onde que ia dar se eu não tomasse uma ação, se eu não fosse ativo no processo, entendeu?
Alexia: Agora Lucas, deixa eu te perguntar uma coisa, você podia ter escolhido fazer bolsa em qualquer país falante da língua inglesa. Por que você foi pra França que você não sabia falar, por exemplo?
Lucas: Ah, porque eu queria aprender o francês, na verdade. O inglês não ia somar nada pra mim, assim zero.
Alexia: Ia ser só mais uma vez lá.
Lucas: Ia ser só mais uma vez. O meu tataravô, eu tenho um tataravô que era francês, por acaso de Marselha, e eu tinha vontade, cara. Quando eu estava nos Estados Unidos, eu tive uma experiência que foi muito legal, que eu estudei um ano num colégio. Lá todos os colégios oferecem só espanhol, né? Mas eu consegui uma bolsa e fui estudar num colégio particular durante um ano. E lá eu tinha a opção de, ao invés de fazer espanhol, fazer francês. Como espanhol, cara, na Flórida todo mundo fala espanhol pra cima e pra baixo. É quase como se você morasse num país que fala espanhol, já falando português, estudando no colégio, você pega sem muita dificuldade. Aí eu queria alguma coisa diferente, tinha a opção de fazer francês. Aí a minha aula de francês que eu fiz durante um ano lá, só tinham 6 pessoas inscritas, que era optativo, né?
Eram dois venezuelanos, eu de brasileiro, um colombiano e a professora era peruana. Esse era o contexto da nossa aula de francês. Mas cara, foi tão legal, foi tão legal. A professora, ela era muito boa, a turma era pequena, eu curti muito. Então eu tinha vontade de meio que consolidar o aprendizado que eu tinha tido. A UFRJ na época, ela tinha muito mais parcerias com universidades francesas, porque eles têm uma tradição forte na engenharia. Até a Escola Politécnica de Paris, eu acho que ela, na verdade, ela até regula, não é tão distante a criação dela da criação da Escola Nacional do Brasil que se tornou a UFRJ e o IME, se eu não me engano. Eu posso estar enganado, mas se eu não me engano, tem até uma certa proximidade histórica entre as duas escolas. Então eu tinha vontade de fazer esse rolê, entendeu? Foi por isso. Foi mais o contexto.
Alexia: Que máximo.
Lucas: Sim, sim.
Alexia: Realmente, eu acho um máximo isso, porque eu, que nem você, sempre quis morar fora, sempre quis viajar. Meus pais sempre plantaram a sementinha dentro de mim. Desde pequena, eles sempre viajaram muito. Mas eles, morar morar fora, nunca. Então eles sempre quiseram me dar essa oportunidade. E a oportunidade que eles podiam me dar era um mês na Inglaterra, o que eu fui muito privilegiada. Mas um mês não é nada, né? Quando você sabe o que é morar realmente fora.
Mas lá em casa era, minha mãe foi alfabetizada em francês, então eu aprendi francês desde pequenininha. Hoje em dia eu sofro, mas eu continuo lendo e escutando muito bem. Falar, eu já sofro muito. Meu pai fala quatro línguas, aprendeu 4 línguas sozinho. Então isso de você se inserir numa cultura sempre foi muito falado lá em casa, e eles sempre quiseram isso muito pra mim. E é muito legal ver que você, mesmo com “trauma” de ter que se inserir em outra cultura e depois se inserir de novo, e tentar entender como é que as pessoas agem, né? Quis fazer isso de novo no momento adulto, porque você já é adulto nessa época. Então é legal.
Lucas: Sim. Engraçado, eu nunca olhei sob essa ótica, meu pareceu até… Havia um certo sentido de continuidade pra mim, eu acho. Porque, apesar desse processo todo que a gente estava até conversando antes, da dificuldade de inserção num lugar, da dificuldade de inserção no outro, no meio daquele contexto ambíguo de onde você está ali, mas você não faz parte daquilo que eu sentia nos Estados Unidos, eu tive, por exemplo, bolsas de acolhimento. E uma dessas bolsas de acolhimento foi nessa aula de francês, por exemplo.
Então eu acho que de certa forma… E como eu falei, né? Eu tenho uma referência familiar ligada à França, né? Então eu lembro da minha avó falando do avô dela, né? “Ah o vovô Lyon Russelior, ele tinha olhos verdes, escrevia muito bem.” Esses dias eu até consegui achar na internet um jornal com uma notícia falando alguma coisa dele, sei lá de que ano, 1900 e qualquer coisinha. Então essas coisas, eu acho que conseguiram amarrar tudo isso num outro contexto, uma outra luz que acabou me impulsionando.
Alexia: Tá. Então você foi pra França, ficou em Marselha por quanto tempo?
Lucas: Foi um ano, um ano letivo, aproximadamente 10 meses.
Alexia: Sim. Aí voltou pro Brasil?
Lucas: Não… Eu voltei para o Brasil, que eu tive que terminar a formação. Parte do esquema da bolsa é que você tem que voltar e ficar pelo menos 2 ou 3 anos no Brasil. E cara, pra mim, uma das coisas que eu acho interessante do processo de morar fora, de novo, que é muito individual, tem gente que realmente vira as costas e vai pro mundo. Mas, pra mim, o processo de morar fora, eu sinto como se ele me fizesse mais brasileiro.
Tipo assim, como eu já vivenciei tantas vezes o processo de não pertencer e eu já entendi que eu não vou ter esse senso de pertencimento, essa parte cultural plena em nenhum outro lugar do mundo, eu me torno muito mais pro Brasil, né? Então, na verdade, eu não esperava estar tendo essa conversa com você aqui hoje de Zurique. Foi muito engraçado, porque eu me formei, né? Eu terminei o ano que eu fiz em Marselha, voltei, me formei, fiquei uns 4-5 anos trabalhando numa empresa de engenharia lá no Rio. E cara, eu estava assim, eu passei um período que eu estava… Teve crise de petróleo, demitiram 450 pessoas na empresa num mês, aquele clima super instável. Aí eu comecei a mentalizar pedindo pro universo que me mostrasse como que eu pudesse pra ser mais útil. Porque o mundo que eu estava vivendo não fazia sentido pra mim. Eu morava na Praça São Salvador e eu trabalhava no centro.
Alexia: Nossa, eu fui tanto lá.
Lucas: Ali é uma delícia, cara.
Alexia: Eu trabalhei no Porta, né? No Porta dos Fundos e era ali do lado.
Lucas: Que legal.
Alexia: Era ali do lado mesmo.
Lucas: Na Glória, não era?
Alexia: Não. Era na Rua das Laranjeiras, só que era tipo, sei lá, 5 minutos andando da praça São Salvador. Então, sempre no final do trabalho, todo mundo ia pra lá. Fiquei muito tempo lá.
Lucas: Então se bobear, a gente já se cruzou aí. Esse mundo é pequeno. Então eu morava ali, cara, e ali de manhã, eles distribuem café da manhã para os moradores de rua. E tem um monte de coisa muito legal que eles fazem, mas é meio chocante você, todo santo dia de manhã, passar por tantos moradores de rua, tantos e tantos. E num trajeto curto, dali pro centro, pegava um metrô, 20 minutos eu estava…
Alexia: Sim.
Lucas: Então aquilo ali, eu ficava me perguntando, “Eu me sinto uma pessoa capaz. É isso que eu quero estar trabalhando na minha vida? É aumentar a eficiência da produção de petróleo, é esse que é o objetivo da minha vida?” Sabe? “Aumentar a margem de lucro na exploração de commodity.” Okay, eu não tenho nenhuma crise ética com o uso do petróleo, eu gosto de dirigir meu carro, eu gosto de pegar o avião e viajar, sabe? Eu acho que tem que ter…
Alexia: Um balanço.
Lucas: Um balanço. Mas eu estava me questionando assim. E no meio disso tudo, cara, teve uma parada muito doida que aconteceu comigo que eu estava buscando qual que ia ser o meu próximo passo. E eu lembrei de um amigo meu… Eu assisti um vídeo na internet que eu lembrei de um amigo meu que eu tinha conhecido, ele é Islandês, mas ele mora na Inglaterra, e eu lembrei dele. Fazia meses, muitos meses, quase um ano que eu não falava com ele. Eu lembrei dele e eu peguei o celular pra mandar o vídeo que eu tinha visto. Aí eu peguei o celular pra mandar uma mensagem pra ele, eu só peguei o celular, aí uma pessoa me chamou no trabalho, aí virei e conversei com a pessoa.
Quando eu voltei pro meu celular, ele me mandou uma mensagem me oferecendo um trabalho, falando que ele tinha uma vaga na equipe dele lá na Inglaterra e que ele tinha pensado em mim. Que, na verdade, ele foi promovido e ele estava precisando de gente que ele confiasse, e ele queria me convidar para fazer o processo e poder trabalhar lá com ele. E assim, o contexto em que isso aconteceu, pra mim, foi muito marcante. Tem uma frase do Pequeno Príncipe que é, “Quando o mistério é impressionante demais, a gente não ousa desobedecer."
Alexia: Verdade.
Lucas: Então eu, cara, eu não estava procurando isso naquele momento da minha vida, eu estava muito mais voltado assim… Para você ter uma ideia, eu cheguei a assinar o contrato de um MBA na FGV de relações governamentais, porque eu estava querendo usar do meu know-how dentro da área de óleo e gás para trabalhar como assessor no desenvolvimento de políticas ligadas à essa área, porque tem um nível de regulamentação altíssimo. Era uma forma de utilizar o que eu já tinha e me inclinar na direção de um trabalho pro bem público. Mas eu assinei o contrato, cara, e dois dias depois a FGV me ligou falando que eles cancelaram a turma. E, na semana seguinte, eu recebi esse telefonema, essa mensagem, na verdade. Então assim, eu falei, “Cara, então vou…”
Alexia: Exato.
Lucas: “Então bora, vamos ver no que vai dar.” E dali, eu fui, passei um ano e meio trabalhando na Inglaterra numa empresa de aviação. Eu passei 3 meses morando nos Emirados Árabes tocando projeto lá. Foi uma experiência interessante, porque já estamos aí… Teve a ida pros Estados Unidos, volta para o Brasil, ida para a Espanha… Pra Espanha não, pra França. Aí da volta da França foi rapidinho, 10 meses…
Alexia: Sim, comparado com a sua vida.
Lucas: Pra quem já viveu… Já foi de boa.
Alexia: Exato, comparado com a sua vida, sim.
Lucas: Aí cara, eu achei que a ida para Inglaterra, eu ia matar essa no peito, né? Eu falei, “Ah velho, vai ser super suave.” Cara, não foi.
Alexia: Não?
Lucas: Não foi.
Alexia: Você foi parar onde na Inglaterra? Em Londres mesmo?
Lucas: Então, aí que está o famoso jump of the cat.
Alexia: Sim.
Lucas: Era em volta de Londres. Na verdade, como eu estava trabalhando numa empresa aérea, numa companhia aérea, eu estava trabalhando no Gatwick que fica ao sul de Londres. E a cidade mais próxima ali é uma cidadezinha chamada Crawley, que fica uns 50 minutos de trem do centro de Londres. E na minha lógica de brasileiro, eu falei “Cara, vou morar perto do meu trabalho, lógico, né? Não faz sentido nenhum, eu vou pagar um aluguel mais caro para morar no centro de Londres, para pagar deslocamento.” Trens caríssimos em Londres. “Pagar um trem caro para eu ficar 50… Não, óbvio que não.”
Alexia: Sim.
Lucas: E eu me coloquei em Crawley. E cara, foi um erro de cálculo isso daí porque, na verdade, ninguém do meu perfil mora em Crawley, entende?
Alexia: Entendo.
Lucas: Qual cara com 28 anos de idade com ambições e desejos de impactar positivamente o mundo, ter uma carreira, não precisa nem ser muito transformador… Querer ser o próximo Gandhi.
Alexia: Ambicioso, digamos assim.
Lucas: É, de boa, querer crescer na carreira, vai fazer em Crawley. Não tem chonga nenhuma em Crawley.
Alexia: Nada.
Lucas: Então eu fiquei super isolado. Aí eu comecei a sentir o negócio ficando meio ruim emocionalmente mesmo, sabe? Porque eu estava falando dos caminhos. Eu tenho até uma frase que eu falo assim, que a gente começa a entender melhor os caminhos do nosso coração com o tempo. Então começa a ver o caminho inclinando, eu falei “Eu sei onde é vai dar essa estrada, eu já caminhei isso daqui.” Então eu falei, “Cara, eu preciso fazer alguma coisa antes que vire um problema eu estar aqui.” Mas eu tinha o pulo do gato, que eu fui contratado em função da indicação de um camarada meu, né? Então eu não podia dar 6 meses e pipocar que ia ficar… Enfim, aí eu fiquei matutando como eu ia administrar essa história toda. E no início, quando eu fui contratado, o diretor do departamento, ele tinha falado que ele apoiava o pessoal poder se desenvolver, estudar e tal, e que se eu quisesse fazer um mestrado, ele ia apoiar e tal. Pensando ele que eu ia fazer alguma coisa em tempo parcial, né? Aí foi, foi, foi. Aí chegou mais lá na frente, eu encontrei no MBA uma saída interessante para eu poder sair do trabalho, voltar para o trilho do que eu estava querendo fazer e usar como ponte para eu voltar para o Brasil. Então foi isso que aconteceu, então eu não queria voltar para os Estados Unidos, já tinha tido aquela vivência. Anote, o meu objetivo não era voltar para os Estados Unidos, eu fui fazer um MBA na Espanha, quem vai fazer um MBA na Espanha para voltar para os Estados Unidos? Isso não acontece, até porque os Estados Unidos olha pro resto do mundo em termos educacionais tipo assim… né?
Alexia: Sim, sim. Que é um grande erro, por sinal. Porque convenhamos.
Lucas: Cara, vou ter falar, a experiência educacional que eu tive no IESI que foi onde eu fiz o meu MBA lá em Barcelona, cara, maravilhosa. Eu, assim, gostei muito da qualidade dos professores. A galera, tem algumas pessoas que fizeram intercâmbio durante o MBA para outras universidades nos Estados Unidos, Columbia, Berkeley. Assim, existe um viés, bias, óbvio que tem o bias, mas assim, o que todo mundo falava… E não tinha necessidade de todo mundo combinar de falar isso é que o nível era igual ou pior. Sendo que você se ferrava, porque você não tinha desenvolvido e não fazia parte do clubinho da galera, né? Então eu fiquei muito bem impressionado com a qualidade do ensino. Gostei muito do MBA, eu curti muito. E foi justamente nesse processo aí que logo antes, assim, bem no início do MBA que eu firmei meu relacionamento com a minha noiva. E aí começou a ter os ajustes das placas tectônicas. Ela tinha trabalhado como Au Pair na Alemanha durante um tempo, aprendeu o alemão. Ela é brasileira, a mãe dela é suíça e ela é formada em direito no Brasil. E aí ela aplicou para fazer um mestrado em direito internacional aqui em Zurique. Então ela ficou fazendo o mestrado dela aqui em Zurique, eu fiquei fazendo meu MBA lá em Barcelona. E cara, e aí bom, aí foi muito maneiro, porque nós éramos 38 brasileiros na turma de 370, sendo que sei lá, 70% da galera estava com partner, né? Então tinha mais, enfim, seus respectivos.
Alexia: Sim.
Lucas: Então, no total, dava uns 70 caras. Então pra mim foi tipo uma reinserção brasileira no meio de um contexto de estar morando fora que foi maravilhoso pra mim. Foi tipo beber um copo d’água depois de uma temporada. E tudo naquele drive de voltar para o Brasil. O meu plano no início, ele estava super bem desenhado. Eu ia fazer o meu MBA, eu ia ser aprovado na McKinsey e eu ia trabalhar dentro da McKinsey na prática de… Como é que chama? Esqueci o nome exato agora, mas é basicamente consultoria voltada para órgãos públicos. Não sei se você conhece a Patrícia Helen, a secretária de tecnologia e desenvolvimento econômico de São Paulo.
Alexia: Sim, já escutei falar, não conheço ela muito bem, porque não é minha área mesmo, mas sei quem é.
Lucas: É uma pessoa super interessante que tem uma história super inspiradora e ela fez essa história. Ela se formou, por assim dizer, na McKinsey e depois ela fez a transição para o governo.
Alexia: Uhun.
Lucas: Num cargo técnico, mas dentro do governo. Então eu achei super legal, era mais ou menos isso que eu queria fazer. Mas aí com o passar do tempo, aqui em casa a gente foi vendo, eu deixei de lado a ideia da consultoria, eu comecei a procurar alternativas para voltar para o Brasil que fossem na indústria, para que eu ainda tivesse o mínimo de vida própria e pudesse ter um relacionamento, e a gente poder estar planejando casar, filhos, etc.
Alexia: A vida. Exato, a vida, na verdade.
Lucas: A vida, exato. E aí, cara, nesse processo, o que aconteceu? Eu bati na trave para um monte de vagas. Coisas, de novo, que ninguém explicava. Eu recebia feedbacks ótimos, chegava na última etapa e a proposta não vinha. Eu fiz um processo seletivo para uma empresa no Brasil chamada Dahrén que ninguém ouviu falar, mas ela está na SP 500, ela é uma empresa gigantesca. Trabalha na parte de ciências da vida, que é todo o maquinário que dá apoio a parte de farma e medicina, equipamentos médicos e tal. Eu fiz o processo com eles, programa super legal, eles me fizeram uma proposta de trabalho, só que a compensação não estava dando para o que eu tinha investido, o que eu tinha de empréstimo em euro para ganhar em real naquele nível. Eu conversei com eles e falei, “Olha gente, não vai dá. Valeu, mas nessas condições…”
Alexia: Obrigada, é.
Lucas: E aí, cara, eles voltaram pra mim e falaram assim, “Não Lucas, olha só, a gente gostou muito de você. Você é americano, não é?” Eu falei, “Sou cara.” “Que tal você fazer essa entrevista aqui para uma vaga nos Estados Unidos? Que aí eles vão estar te dando o pacote de acordo com o que você está querendo.” Aí eu falei, “Tá.”
Alexia: “Tá…”
Lucas: Long story short. Eu assinei um contrato de trabalho para a Califórnia.
Alexia: Logo para Califórnia, você foi lá pro meio do terremoto, o que seu pai não queria.
Lucas: Exatamente, onde meu pai não queria lá no princípio. Então eu assinei esse contrato, mas como os Estados Unidos todo, principalmente nessa empresa que eu tô trabalhando, está todo mundo fazendo home office, a minha chefe falou, "Cara, home office por home office…”
Alexia: Isso foi agora então.
Lucas: É, isso tem 5 meses, na verdade assim, a conversa, né? Eu comecei a trabalhar tem 2. Aí ela falou assim, “cara, home office por home office, fica aí.”
Alexia: Ah é, né? Porque pra que te mudar inteiro para a Califórnia, fazer você ir lá para ficar trabalhando de home office de lá. Não faz o menor sentido. Caraca, que máximo isso.
Lucas: Então basicamente…
Alexia: Só fuso horário que você tem que… Nossa, fuso horário com a Califórnia.
Lucas: Então, o lado bom é porque, na verdade, a empresa, ela tem alguns lugares nos Estados Unidos e minha chefe me deu a opção no processo seletivo aonde que eu preferiria, se era Minneapolis ou Los Angeles. Aí eu pensei muito, falei, “Sempre quis viver em Minneapolis, mas acho que vou optar por Los Angeles.” E enfim, fiz o processo por lá, mas a minha chefe fica em Minneapolis, então ao invés de 9 horas de fuso, é 7. O que é menos, mas cara, tá sendo bem razoável assim. Eu, em geral, estou trabalhando até umas 8 da noite, que no horário dela é até 1h da tarde. Então é basicamente uma manhã compartilhada. E se tem necessidade eu estico também, uma reunião ou outra, se não for todo santo dia, até umas 11h da noite no batidão da estrada, tá valendo por esse lado. Se passar, começar a passar muito disso, aí começa a ficar mais chato.
Alexia: É, eu não sei, eu já trabalho remotamente há 5 anos, alguma coisa assim e com diferentes fusos horários também. Agora a gente está aqui em Portugal, mas antes era Brasil e Estados Unidos, e agora é Portugal, Estados Unidos e Brasil. Então não tem tanta diferença no final das contas mas, por exemplo, ao mesmo tempo me faz pensar do tipo, “Eu não preciso ver isso hoje, eu posso deixar para amanhã por causa do fuso horário.” Sabe? Isso também me dá um pouco mais de liberdade, do tipo, eu não preciso ficar trabalhando sem parar porque não vai ser resolvido isso hoje, só amanhã no horário do Brasil, sabe? Então também é bom, eu gosto disso também. E você agora em Zurique, é a primeira vez que você está morando na Suíça?
Lucas: É.
Alexia: E, assim, é totalmente novo, né?
Lucas: Cara, é totalmente novo, mas vou te falar, você morar num país totalmente novo quando o seu esposo ou esposa tem ligação familiar com o local, é uma, de novo, outra experiência completamente nova. É tipo assim, eu consigo ver um futuro longo prazo na Suíça, entende?
Alexia: Isso é muito bom.
Lucas: Porque tem uma história, tem uma infraestrutura emocional por assim dizer, sabe? Que você tem a tia-avó, tem algumas tia-avós. Sei lá, a avó dela já faleceu, mas tia-avó, tio-avô, um monte de primo que a gente interage. Não é aquele primo que você liga uma vez ao ano, não, eles vieram jantar aqui em casa ontem. Então está sendo super legal assim, fazia tempo que eu não morava num país que eu não entendia chongas do que estava sendo dito. E é foda, cara, porque com o perdão da palavra, mas eu ainda falo francês, se fosse a pontinha francesa da Suiça, né? Mas tudo bem, é bom porque eu vou me desenvolver mais, já está na minha lista aqui de afazeres. Assim que eu me adaptar no trabalho novo, eu vou começar minhas aulinhas de alemão.
Alexia: Ah, tem que ser. E parece que o alemão daí é muito diferente do alemão da Alemanha também.
Lucas: É outro rolê. É como se você fosse estudar sozinho, só que de vez em quando as pessoas têm a bondade de falar o que eles chamam de HochDeutsch, que é o alto alemão, que é o alemão normal.
Alexia: Agora, Lucas, eu, depois a gente pode falar sobre isso, não precisa ser agora, mas eu tenho uma professora maravilhosa para você aí. Ela fala português perfeitamente, porque a mãe dela era brasileira. Ela foi pra aí há muito tempo e ela fala português muito bem e dá aulas online. Então se você quiser depois, eu te falo, é a Claudia.
Lucas: Vale o contato, valeu.
Alexia: Sim, com certeza.
Lucas: Tá ótimo.
Alexia: Com certeza. Agora Lucas, para encerrar, uma coisa que eu estou perguntando pra todo mundo assim. Existe algum lugar no Brasil que você indique para as pessoas visitarem que não seja tão turístico que você ama? Porque, por exemplo, clichê Rio de Janeiro, São Paulo, Salvador, sabe? Florianópolis todo mundo sempre fala. E já teve aqui Chapada Diamantina, já teve Manaus, já teve Lençóis Maranhenses, já teve Ibitipoca que eu, pessoalmente, amo. Tem algum lugar assim que você goste que você gostaria que as pessoas soubessem mais sobre?
Lucas: Você falou de alguns que eu ia falar, né? Aí já dá aquela reduzida.
Alexia: Mas pode falar de novo.
Lucas: Ah, cara, eu não sei o quanto que as pessoas têm… É porque Ilha Grande já é também considerada bastante turística, já entra no lote do Rio de Janeiro.
Alexia: Turistão.
Lucas: É, do turistão. Um lugar que eu não fui ainda, mas que está na minha lista é o Jamelão.
Alexia: Não…
Lucas: Jalapão… Jamelão não.
Alexia: Jamelão é o sambista.
Lucas: É verdade. Jamelão é um sambista, pode crer. É o Jalapão, é verdade. É o Jalapão. Tem um camarada meu que eu tive uma reunião mais cedo hoje, que ele falou que estava indo lá pro Vale do Jalapão. Tem uma galera que foi, eu vejo as fotos…
Alexia: Tocantins, né?
Lucas: Acho que é.
Alexia: Eu tô doida pra ir também. Eu quero muito ir. Mas primeiro eu preciso descobrir Portugal, que eu vim pra cá durante a pandemia, ainda não consegui nem descobrir Portugal direito, então…
Lucas: Tem muita coisa.
Alexia: Tem.
Lucas: Claro. As ilhas…
Alexia: Não, Açores…
Lucas: Açores cara, eu não fui ainda, está no meu to-do list... Olha, outra que dá pra recomendar também é a Chapada dos Veadeiros. Também é fora do ciclo para o pessoal que não conhece tanto o Brasil, mas é muito bonito também, muito bonito também. É muita cachoeira. Cara, o legal do Brasil, na verdade, é você se meter nuns buracos que parece que não tem nada e perguntar para um tiozinho local… Olha, o banho de rio mais bonito que eu já tomei na vida foi no Mato Grosso dentro de uma fazenda de um cara que eu conheci um pessoal que sabia o caminho, aí pedia pro cara, você atravessava a fazenda do cara, entrava. Cara, sabe aquela água turquesa, cristalina passando dentro de um cânion. Um negócio de filme, surreal e cara, não tem guia turístico que te leve, é umas coisas assim. Por isso que assim, esses lugares, a gente fala assim, “Ah, Chapada Diamantina, Chapada dos Veadeiros, o Pantanal.” Fica uma coisa meio assim. Até se a pessoa for tentar ir lá, às vezes, ela vai fazer aquela rota turística, né? Mas se você, de alguma forma puder conectar com a galera local, cara, é um outro Brasil para conhecer.
Alexia: Sim. Isso é uma dica, eu acho, que pra qualquer lugar que você for, né? Escape do turistão, pergunte para os locais onde você tem que ir. Eu fiz isso na última vez que eu viajei em Portugal. A gente foi pra uma cidade chamada Tomar, perto de Lisboa e a gente foi pra uma aldeia chamada Dornes. E assim, foi o banho de lagoa, rio mais ou menos que eu tomei, maravilhoso que não tinha ninguém, um lugar paradisíaco que muita gente falou que parecia Salt Lake City com aquelas montanhas por trás e etc. Mas assim, é lindo demais. Lindo, lindo. E eu acho que essa é uma dica preciosa de saia do turistão, pergunte pros locais e vai. E vai. Só tome cuidado onde é que você tá também, né?
Lucas: Lógico. Tem que saber pra quem você está perguntando.
Alexia: Exato. Tem que ser confiável. Bom, obrigada por você ter vindo, espero que você tenha gostado. Você tem que voltar pra gente saber se você foi pra Los Angeles, se você foi pra Mineápolis, se você ficou aí ou não nos próximos capítulos.
Lucas: Tá certo. Beleza. Eu sabendo, eu posso até te dizer.
Alexia: Exato, ótimo. Então obrigada e até a próxima.
Lucas: Valeu. Grato pelo convite, tudo de bom.